A implementação progressiva da Declaração Única de Importação (DUIMP) está promovendo uma das maiores transformações no comércio exterior brasileiro. No centro dessa mudança está o Catálogo de Produtos (CP), uma ferramenta que exige uma nova postura dos importadores. Subestimar seu impacto não é uma opção, pois a forma como descrevemos nossas mercadorias mudou fundamentalmente.

O Fim da "Descrição Livre" e a Ascensão dos Atributos

No modelo anterior da Declaração de Importação (DI), a descrição do produto era feita em um campo de texto livre, o que resultava em padrões variados e, muitas vezes, em informações incompletas, um "copia e cola" da INVOICE, com tradução literal. São raros os casos de importadores que dão a devida atenção para a correta descrição das mercadorias importadas. Com o Catálogo de Produtos, essa prática chega ao fim. O antigo campo de texto perde o parte do protagonismo para os "Atributos"

Os atributos são campos estruturados e padronizados, definidos pela Receita Federal e órgãos anuentes, que solicitam informações técnicas específicas sobre a mercadoria com base em sua NCM. Por exemplo, para um simples parafuso, o sistema pode perguntar sobre o material, o tratamento térmico ou o percentual de cada componente. Essas informações, que agora formam o núcleo da descrição aduaneira, raramente constam nos documentos tradicionais de importação (InvoicePacking List, BL/AWB, etc.). Dependendo do órgão anuente, podem ser exigidas até mais do que uma dezena de detalhes técnicos sobre a mercadoria.

Descrição x NCM/NESH

A descrição do Produto no Catálogo deve espelhar a NCM e a NESH. Nossa recomendação é que o texto da NCM e da NESH faça parte da própria descrição do produto, estabelecendo o melhor vínculo possível entre eles. O rigor técnico garante que a classificação fiscal está correta, pois a NCM é o balizador que define os atributos a serem preenchidos

A elaboração da descrição, em coerência com os atributos exigidos, serve como um processo de revalidação da NCM escolhida, ajudando o Gestor (GCP) a sanear a base de dados. Isso é vital para evitar erros que geram multas e comprometem o tratamento tributário

Diferença entre "Produto" e "Mercadoria"

A descrição que você cadastra no Catálogo de Produtos é a do Produto (a essência da mercadoria). Esta descrição deve ser única e não deve conter dados que mudam a cada embarque.

Informações variáveis (que mudam a cada operação), como número de lote, número de série, validade ou safra, pertencem à descrição da Mercadoria e devem ser informadas apenas no campo específico da DUIMP no momento do registro do despacho.

As diversas cores de um tecido não o transformam em um novo produto, há quem cadastre como um novo produto o rolo de um tecido idêntico, apenas porque mudou a cor, multiplicando em dezenas de vezes a quantidade de cadastros desnecessariamente. 

Para um mesmo produto cadastrado você pode incluir diversos "sku´s" ou "part numbers", desde que a essência do produto seja a mesma.

A Inversão do Fluxo: O Planejamento Deve Anteceder o Embarque

Essa mudança impõe uma inversão no fluxo operacional. Se antes a descrição era, por vezes, resolvida às pressas com a carga já em trânsito, agora o trabalho de catalogação deve ser feito com antecedência, idealmente na fase de planejamento da compra.É preciso entender que o despachante aduaneiro é um especialista em legislação e procedimentos, não em engenharia de produtos. O conhecimento técnico sobre as especificações da mercadoria pertence ao importador. Para NCMs complexas, pode haver dezenas de atributos a serem preenchidos, um trabalho que demanda tempo e consulta técnica junto ao fornecedor. Delegar essa tarefa sem fornecer os dados precisos é um erro grave, pois forçará o despachante a informar dados incorretos para registrar o produto, gerando um risco desnecessário.

A Responsabilidade Legal e os Riscos de um Catálogo Incompleto

A nomeação de um "Gestor do Catálogo de Produtos" no Portal Único é uma facilidade operacional, mas não transfere a responsabilidade legal, que permanece integralmente com o importador. Além das penalidades financeiras, um dos riscos mais críticos é o histórico permanente de erros.Uma vez que um produto é cadastrado no sistema, ele não pode ser excluído. Um registro incorreto pode ser desativado e substituído por uma nova versão, mas o histórico de erros (o log de versionamento) permanece no banco de dados da Receita Federal para sempre. Se você corrigir um produto, o histórico ficará visível, alertando o fisco de que a operação anterior estava, muito provavelmente, equivocada.

Infração
Penalidade Potencial
Informação Inexata ou Incompleta
Multa de 1% sobre o valor aduaneiro (mín. R$ 500, máx. 10% da DI)
Classificação Fiscal Incorreta
Multa de 75% sobre a diferença de impostos
Falsa Declaração
Multa de 50% a 100% sobre a diferença de imposto
Falta de Licenciamento (por reclassificação)
Multa de até 30% do valor da mercadoria

A Hora de Agir é Agora

O prazo para a obrigatoriedade total da DUIMP se aproxima. O momento de se adaptar e realizar o saneamento (limpeza e adequação) da sua base de produtos é este. Ferramentas de tecnologia podem auxiliar na análise das descrições antigas e sugerir o preenchimento dos atributos, mas a validação técnica final por parte do importador é indispensável.

Recomendamos uma postura proativa. Encare o Catálogo de Produtos como uma oportunidade para organizar e padronizar as informações de seus produtos, garantindo maior agilidade e segurança jurídica. Não corra o risco de ter sua carga parada na alfândega por falta de um atributo técnico. A nova era do Comércio Exterior exige que a precisão comece em casa.